Ao vivo em Tóquio
(1986)1. Realce (06:48)
Realce
Gilberto Gil
Não se incomode
O que a gente pode, pode
O que a gente não pode, explodirá
A força é bruta
E a fonte da força é neutra
E de repente a gente poderá
Realce, realce
Quanto mais purpurina, melhor
Realce, realce
Com a cor do veludo
Com amor, com tudo
De real teor de beleza
Não se impaciente
O que a gente sente, sente
Ainda que não se tente, afetará
O afeto é fogo
E o modo do fogo é quente
E de repente a gente queimará
Realce, realce
Quanto mais parafina, melhor
Realce, realce
Com a cor do veludo
Com amor, com tudo
De real teor de beleza
Não desespere
Quando a vida fere, fere
E nenhum mágico interferirá
Se a vida fere
Como a sensação do brilho
De repente a gente brilhará
Realce, realce
Quanto mais serpentina, melhor
Realce, realce
Com a cor do veludo
Com amor, com tudo
De real teor de beleza
BRWMB9901135
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
bateria – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
“Por causa dos questionamentos com relação ao seu significado – a imputação de uma minoridade que ela teria dentro de minha obra, já que representaria uma escorregadela na facilidade do efeito pop -, a necessidade, que eu sinto, de fazer a defesa de uma canção que tem para mim um sentido profundo no meu trabalho e no processo de aprendizado que eu coloco como dado essencial da minha relação com o fato de fazer canções – de dizer coisas através de canções populares -, e que diz muito sobre quem eu sou como compositor e sobre o grau de exigência que me imponho para que minhas canções exprimam alguma coisa importante na minha vida.
“Realce é de uma época em que eu me introduzira no campo da meditação, entendida como uma arte mais formal e rigorosa de pensar-se e refletir-se, e estava interessado em possíveis traduções da filosofia oriental para o idioma da canção, tendo resultado num dos concentrados das meditações que eu então fazia e sido resultado de um processo profundo e ruminante, um longo trabalho de elaboração e meditação, sendo ela mesma uma canção sobre o wu wei, termo chinês que significa ‘ação da não-ação’, ou, a impotência que se torna potência, ou, o esgotamento dos contrários nas suas polaridades (um polo se esgota e inicia o que está contido no seu oposto) etc.
“É nesse sentido uma canção ambiciosa e carregada de significados embutidos que vão sendo des-cobertos, como, na cebola, as camadas por debaixo das camadas.
“A letra parte de um escopo geral que é falar do que, à época, eu chamava de ‘salário mínimo de cintilância a que têm direito todos os anônimos’ – nos terminais de metrô, nas arquibancadas dos estádios, nas discotecas. Esse lado saturday night fever está propositalmente explicitado nos três pseudo-refrões, que funcionam para reiterar a macdonaldização da vida cotidiana nas grandes cidades, mas também para dar-lhe uma qualificação de profundidade que necessariamente também existe nessas coisas tão associadas à superficialidade. Por outro lado, cada uma das estrofes que antecedem os ‘refrões’ remontam ao sentido de potência contido no wu wei.
Estrofe I; versos 1, 2 e 3 – “Há uma idéia da força que remete às mudanças geológicas; a um revolver da natureza que se dá por si só. As grandes catástrofes das idades do universo passam como um trator por sobre a condição humana. Ao mesmo tempo, a fonte da força também está à disposição do que chamamos consciência, inteligência, vontade: homo sapiens.” Versos 4, 5 e 6 – “O homem como combustível e energia do motor da natureza, parte e partícipe do moto-contínuo, ciclico-recorrente (o eterno retorno), de criação e destruição, anulação e afirmação, operado pela natureza na história e pela história na natureza. A relação dinâmica entre ambas e o homem como o corte.”
II; 1, 2 e 3 – “O interstício sutil entre a vontade e o resultado, o fazer e o não fazer. O fato de que tudo está ‘afeto’; de que, do ponto de vista quântico, digamos, a mínima partícula de emanação pensátil está ‘afeta’; de que o afeto pertence à totalidade do pulsar existencial das coisas, à dança de Shiva; e mesmo o sentir quieto ali naquele canto pode estar afetando uma estrutura qualquer de uma parte qualquer do universo.” 4, 5 e 6 – “O afeto, portanto, é fogo; portanto, se cuide – mas se descuide, também, do seu sentir; pois de todo modo ele é pleno, dono de si; ele trabalha no campo onde as bactérias se criam, os átomos se criam e os eventos se dão; e, mesmo entre as partículas, o que não é visível nem palpável ainda assim é e pertence ao intercâmbio das afeições amplas, universais.”
III; 1, 2 e 3 – “A autonomia plena da vida sobre nós e o imperativo da fatalidade de ter nascido e ter que morrer; ter que viver esse ‘alfômega’ nascimento-morte, a grande questão colocada para nós.” 4, 5 e 6 – “De como a vida entra pelos olhos e é o ferir incondicional do brilho neles. Sob o sol ou sob a lua, a esteira de luz estendida sobre a superfície do mar será irremediavelmente captada pelos olhos abertos. A irredutibilidade do fenomenólogico. O ser sendo ferido pelos estímulos externos aos quais os seus sentidos, todos, dão sentido; a natureza se fazendo linguagem através do homem.
“A simples exposição dos versos pode não remeter de imediato a significados tão vastos, múltiplos e profundos, que, no entanto, estão engastados na intenção processual da canção; no porquê de ela ter sido feita. Eu não posso exigir de todo mundo a apreensão de todos esses sentidos, mas não posso aceitar a negação deles. Minha impressão é de que, no âmbito das pessoas cultas e inteligentes, afeitas ao dimensionamento cultural encarregador das leituras, Realce não é tão hermética; lida sua letra com o mínimo de atenção, muitos dos seus significados logo se insinuam, e as portas para outras digressões possíveís se abrem.”
*
“Era o momento auge da música disco – aquela linfa, aquela liquefação pop depois da época rock, da época hippie, conceitualmente mais densa. Iniciando o processo de expansão geográfica das minhas atividades e vivenciando o cotidiano das pessoas comuns de vários lugares do mundo, eu desejava conciliar os lugares-comuns das pessoas desses lugares e trazer os elementos da cultura de massa contemporânea internacional em sua complexidade.
“Por ter em mim os traços nítidos do criador marcado pelo compromisso com a banalidade, egresso de uma tradição cultural média brasileira, a da canção popular, eu me sentia parte integrante daquele fenômeno, a que vim a me referir como a ‘superfície do profundo’ – onde o profundo não é captado como tal e só pode ser captado como superficial porque só está na superficialidade.
“E é disso que falam Realce e outras canções minhas da época. Utilizando-se de elementos fáceis e flácidos mas remetendo também aos sentimentos de elevação que cada simples ser pode e deve ter, elas trabalhavam para uma conciliação do conceito de sofisticado com o conceito de banal, contra o reducionismo cataloguista dos cânones clássico e popular e contra a idéia do estanque prevalescendo sobre a do osmótico e interpenetrante.”
*
“Diziam: ‘Ah, o brilho! Está se referindo a cocaína!’ Nunca me passou cocaína pela cabeça, mas é evidente que, no campo da abrangência da canção, você tinha coisas como saturday night fever como elementos, e que a cocaína também estava ali; tudo estava: sexo, drogas e rock and roll, o prazer do hedonismo – assim como o prazer do acetismo. Cortes muito claros entre os dois lados; Ocidente-Oriente.”
*
“Realce custou muito tempo e aflição para ser feita pelas muitas funções sobrepostas com as quais ela se comprometeu de antemão, a começar pela de fecho da triologia dos ‘re’ – que tinha em Refazenda o primeiro e em Refavela o segundo ponto -, em substituição a Rebento, samba que fiz antes e que acabou estando no mesmo álbum, mas que não dava conta do conceito do álbum – que incluía a maré rasa da efervescência disco e o poço fundo da contemplação espiritual.
(“Minhas músicas têm quase sempre um estímulo conceitual, que é também quase sempre o do disco de que fazem parte. Raramente uma canção minha nasce da simples decisão de exercitar as palavras e os sons, fazer quebra-cabeças, ludos criativos. Em geral elas partem de um fundamento religioso, filosófico ou político, de alguma intenção pré-determinada, de algo a ser dito e explicado).
“Eram muito apriorísticas as proposições e o alcance de Realce. Sentidos novos iam sendo exigidos e agregados ao longo do tempo da sua realização, e a cada dia a música ficava mais dificil. Começada aqui, onde anotei as primeiras idéias, soltas, ela tomou umas dez páginas de esboços, e eu só a terminei após dois meses de excursão pelos Estados Unidos, quando já estava gravando o disco, lá.”
*
“A expressão-título surgiu por causa da Lita Cerqueira, fotógrafa, negra, baiana, vinda de Santo Antonio, meu bairro, frequentadora da minha casa e da casa de Caetano, pessoa das nossas relações íntimas e com muitos interesses comuns a nós na época. Ela falava muito em ‘realce’, ‘realçar’…”
2. Nos Barracos Da Cidade (Barracos) (04:40)
Nos Barracos Da Cidade (Barracos)
Gilberto Gil
Liminha
Nos barracos da cidade
Ninguém mais tem ilusão
No poder da autoridade
De tomar a decisão
E o poder da autoridade
Se pode, não fez questão
Se faz questão, não consegue
Enfrentar o tubarão
Ô-ô-ô, ô-ô
Gente estúpida
Ô-ô-ô, ô-ô
Gente hipócrita
O governador promete
Mas o sistema diz não
Os lucros são muito grandes
Mas ninguém quer abrir mão
Mesmo uma pequena parte
Já seria a solução
Mas a usura dessa gente
Já virou um aleijão
Ô-ô-ô, ô-ô
Gente estúpida
Ô-ô-ô, ô-ô
Gente hipócrita
BRWMB9901136
© Gege Edições Musicais / © Super Produções Artísticas LTDA. (adm. por Warner/Chappell Edições Musicais LTDA.)
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
percussão – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
Outras gravações:
“A voz do bandolim”, Armandinho, Vison 2001
“Banda Bate Lata”, Circo-eldorado 1999
“Projeto axé”, Bandaxé, Centro Projeto Axé De Defesa Da Criança 2006
“Cidade Negra”, Sony 1998
“Quanto mais curtido melhor”, Cidade Negra, Sony 2000
“Maxximum”, Cidade Negra, Sony Music 2005
“Kaya n’ gan daya ao vivo”, Gilberto Gil, Som Livre 2003
“Grandes mestres da MPB – vol. 2”, Gilberto Gil, Warner Music 1997
“Projeto especial Jornal Folha”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“E-collection”, Gilberto Gil, Warner Music 2004
“Gilberto Gil no palco – nova série”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“Ao vivo em Toquio”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Bandadois”, Gilberto Gil, Warner Music 2010
“Banda Um”, Gilberto Gil, Warner Music 1994
“Mestres da MPB”, Gilberto Gil, Warner Music 1992
“Dia dorim noite neon”, Gilberto Gil, Warner Music 1985
“Sem limite – um barzinho, um violão”, Kid Abelha, Universal Music 2007
“A música de Gilberto Gil”, Gilberto Gil, Universal Music 2002
“Um barzinho, um violão”, Kid Abelha, Universal Music 2002
3. Vamos Fugir (08:26)
Vamos Fugir
Gilberto Gil
Vamos fugir
Deste lugar, baby
Vamos fugir
Tô cansado de esperar
Que você me carregue
Vamos fugir
Proutro lugar, baby
Vamos fugir
Pronde quer que você vá
Que você me carregue
Pois diga que irá
Irajá, Irajá
Pronde eu só veja você
Você veja a mim só
Marajó, Marajó
Qualquer outro lugar comum
Outro lugar qualquer
Guaporé, Guaporé
Qualquer outro lugar ao sol
Outro lugar ao sul
Céu azul, céu azul
Onde haja só meu corpo nu
Junto ao seu corpo nu
Vamos fugir
Proutro lugar, baby
Vamos fugir
Pronde haja um tobogã
Onde a gente escorregue
Todo dia de manhã
Flores que a gente regue
Uma banda de maçã
Outra banda de reggae
BRWMB9901137
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
sopros – Raul Mascarenhas
bateria – Jorginho Gomes
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
Gravações:
“Nenhum motivo explica a guerra”, AfroReggae, Gege
“Banda Caiana”, Banda Caiana, Warner
“Simbora”, Daude, Natasha
“Pé na estrada”, Dora Vergueiro, Columbus
“Baioque”, Elba Ramalho, BMG
“Ao vivo em Uberlândia”, Marco e Mário, Sony
“Nega Rosa”, Nega Rosa, Polygram
“Gueto do universo”, Planta e Raiz, Arsenal Discos
“Outra música”, Silvio de Oliveira, Natasha
“Skank”, Skank, Sony
[ Gimme Your Love, de Gilberto Gil e Liminha ]
4. Aquele Abraço (07:21)
Aquele Abraço
Gilberto Gil
O Rio de Janeiro continua lindo
O Rio de Janeiro continua sendo
O Rio de Janeiro, fevereiro e março
Alô, alô, Realengo – aquele abraço!
Alô, torcida do Flamengo – aquele abraço!
Chacrinha continua balançando a pança
E buzinando a moça e comandando a massa
E continua dando as ordens no terreiro
Alô, alô, seu Chacrinha – velho guerreiro
Alô, alô, Terezinha, Rio de Janeiro
Alô, alô, seu Chacrinha – velho palhaço
Alô, alô, Terezinha – aquele abraço!
Alô, moça da favela – aquele abraço!
Todo mundo da Portela – aquele abraço!
Todo mês de fevereiro – aquele passo!
Alô, Banda de Ipanema – aquele abraço!
Meu caminho pelo mundo eu mesmo traço
A Bahia já me deu régua e compasso
Quem sabe de mim sou eu – aquele abraço!
Pra você que meu esqueceu – aquele abraço!
Alô, Rio de Janeiro – aquele abraço!
Todo o povo brasileiro – aquele abraço!
BRWMB9701581
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
Outras gravações:
“Arthur Moreira Lima”, Arthur Moreira Lima, SONY
“Show Elis e Miele”, Elis Regina e Miele, Polygram
“Força de expressão”, Ivo Meirelles e Funk’n’lata, FC Record
“Leandro Sapucahy ao vivo”, Leandro Sapucahy, Warner Music
“Ao vivo no Metropolitam”, Legião Urbana, EMI
“Songbook Gilberto Gil vol1”, Tim Maia, Lumiar
“MPB em CY”, Quarteto em Cy, CID
“Igreja Jesus Cristo Dos Santos Do Ultim”, Celebração 2004
“A musica de Gilberto Gil”, TCPA/TOP CAT 2007
“3 na bossa”, Deck Produções Artisticas 2014
“Samba da minha terra”, Alexandre Pires, Emi Music 2013
“Cristo 80 anos – show da paz”, Alexandre Pires, GLP Marketing e Entretenimento 2011
“Na veia”, Arlindo Cruz e Rogê, Polysom 2016
Arthur Moreira Lima, Sony 2000
“SPB”, Augusto Martins, Mills Records 2011
“Amores do Rio Firjan”, Banda e coral da Firjan 2002
“Rod Hanna disco Club”, Banda Rod Hanna, Lua Produçõe Sonoras Especiais 2008
“Barra 69”, Caetano veloso com Gilberto Gil, Universal 1996
“Cantando o Brasil”, Coral de Itaipu, Itaipu Binacional 2014
“Daniela Mercury e cabeça de nós todos”, Oesp Mídia S.A 2013
Flora Caju, Dimi Zumque, Claudia Teixeira/CT Prod. e Eventos 2002
“Retrato cantado – Dimi Zumquê 25 anos”, Dimi Zumque, Edmilson Donizeti Da Silva 2014
“Light my fire”, Eliane Elias 2012
“Show Elis e Miele”, Elis e Miele, Polygram 1998
“Elis Regina revistada”, Elis Regina, Dubas 2005
“Elymar canta Marron”, Elymar Dos Santos 2011
“Equale no Expresso 2222 Cdyou”, Equale, Eletrônica Digital 2001
“Som do barzinho vol. 10”, Evandro Marinho, Universal Music 2001
“Evelyn”, Evelyn, Som livre 2005
“Perfil – Fernanda Abreu”, Fernanda Abreu, Som Livre 2010
“ALM a música ao vivo”, Francis Hime, Biscoito Fino
“Live in London 71 – disco 3 “, Gal Costa e Gilberto Gil, Polysom 2014
“Historia da MPB”, Gilberto Gil, Abril Cultural, Fasciculos 2012
“As letras que o Brasil canta”, Gilberto Gil, Academia Brasileira De Letras 2007
“Música do seculo 5” Gilberto Gil, Caras 1999
“Bar do Mineiro Santa Teresa Rio de Janeiro”, Gilberto Gil, Dubas 2003
“Anos dourados – anos 60 e 70”, Gilberto Gil, Emi 1999
“Projeto especial Readers Digest”, Gilberto Gil, Emi music 1999
“Autografos de sucessos”, Gilberto Gil, Emi Music 1982
“Viagem Nestlé pela literatura”, Gilberto Gil, Fundação Nestlé 2003
“Banda Larga ao vivo em São Paulo”, Gilberto Gil, Gege Produções Artísticas 2008
“T.s. Os Dias Eram Assim”, Gilberto Gil, Som Livre 2017
“Grandes hits MPB1”, Gilberto Gil, Gradiante 2001
“Classicos do Brasil”, Gilberto Gil, L & N 2003
“55 anos de sucessos”, Gilberto Gil, Philps 1978
“Minha historia”, Gilberto Gil, Polygram 1993
“Projeto especial Jornal Correio Da Bahia”, Gilberto Gil, Polygram 1999
“A voz de… “, Gilberto Gil, Polygram 1981
“Personalidade”, Gilberto Gil, Polygram 1987
“Projeto especial lab. Brystol Myers Squibb”, Gilberto Gil, Polygram 1999
“20 grandes sucessos da MPB”, Gilberto Gil, Polygram 1999
“20 obras primas”, Gilberto Gil, Polygram 1996
“A arte de Gilberto Gil”, Gilberto Gil, Polygram/Fontana 1985
“Back in Bahia- ao vivo (1972)” Gilberto Gil, Discobertas 2017
“Perfil”, Sigla, Gilberto Gil 2005
“Gilberto Gil samba ao vivo”, Gilberto Gil, Sony Music 2014
“Millenium”, Gilberto Gil, Universal Musical 2000
“Os sambas do milênio vol. 2”, Gilberto Gil, Universal Music 2000
“Palco MPB – 4a edição”, Gilberto Gil, Universal Music 2005
“Serie sem limite – cd 2”, Gilberto Gil, Universal Music 2001
“Gil projeto especial ABN ANRO/Mastercard”, Gilberto Gil, Universal Music, 2006
“Daslu samba rock”, Gilberto Gil, Universal Music 2005
“Tubos apolo – proj. especial”, Gilberto Gil, Universal Music 2003
“Gilberto Gil – 2 anos”, Gilberto Gil, Universal Music 2010
“O quintal do Zeca”, Gilberto Gil, Universal Music 2011
“3m – projeto especial”, Gilberto Gil, Universal Music 2010
“Samba in Rio”, Gilberto Gil, Universal Music
2010
“Chacrinha – o musical (cd2)”, Gilberto Gil, Universal Music 2014
“Lugar comum”, Gilberto Gil, Universal Music 2008
“Rio 450”, Gilberto Gil, Universal Music 2015
“Unplugged”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Eletracústico”, Gilberto Gil, Warner Music 2004
“Acustico”, Gilberto Gil, Warner Music 2004
“Enciclopedia musical brasileira”, Gilberto Gil, Warner Music 1999
“Chill Brazil”, Gilberto Gil, Warner Music 2006
“Eletracústico”, Gilberto Gil, Warner Music 2004
“Soy loco por ti America”, Gilberto Gil, Warner Music 1995
“Gilberto Gil no palco – nova série”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“1975-1997 bossa,samba & pop”, Gilberto Gil, Warner Music 1998
“It ‘s good to be alive – anos 90”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Warner 30 anos”, Gilberto Gil, Warner
Music 2006
“Acoustic”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Samba sempre”, Gilberto Gil, Warner Music 2016
“Chill Brazil copa”, Gilberto Gil, Warner Music 2010
“Carruagem fantástica – Lifetime Achievement Original E Soundtrack”, Washington L. Olivetto 2014
“Unplugged”, Warner Music, Gilberto Gil 2002
“Eletracústico”, Gilberto Gil, Warner Music 2004
“Chill Brazil 4”, Gilberto Gil, Warner Music 2006
“Gilberto Gil no palco – nova série”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“1975-1997 bossa,samba & pop”, Gilberto Gil, Warner Music 1998
“Warner 30 anos”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Acoustic”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Samba sempre”, Gilberto Gil, Warner Music 2016
“Este é o Gil que eu gosto”, Gilberto Gil, Warner Music 1995
“Ao vivo em Toquio”, Gilberto Gil e Banda Um, Warner Music 1994
“Gil + 10”, Gilberto Gil, Som Livre 2011
“Gil e Gal”, Gilberto Gil e Gal, Discobertas 2014
Albatroz, Grupo Equale 1999
“Guilherme Borges Hildebrand”, Grupo Madalena 2007
“Um viagem através da música dio Brasil”, Grupo Solo Brasil
“Força de expressão”, Ivo Meirelles e funk’n lata, F C Record
“Ovalô”, Jorge Autuori Trio, BMG 2004
“Jorginho Gomes in concert”, Jorginho Gomes & Gilberto gil, Jorginho Gomes Produções 2016
“Leandro Sapucahy ao vivo”, Leandro Sapucahy , Warner Music 2008
“Ao vivo”, Leandro Sapucahy, Warner music 2008
“Ao vivo no Metropolitam”, Legião Urbana, EMI 2001
“De todas as maneiras”, Mariama, Polygram 1979
“Tropicalismo”, Melquiades, Ingrid Sales e Paulo Façanhas, Ultra Music 2008
“Samba de pista”, Micheline Wayz, Special 2003
“Serie Bis bossa nova”, Milton Banana Trio 2001
“Moinho”, Moinho, EMI 2009
“Monobloco – minha história”, Monobloco, Som Livre 2011
“Monobloco 10 ao vivo”, Monobloco, MPB Discos e Produções/Universal 2009
“Pagodão dos morenos” Morenos, Som Livre, 1999
“Planeta Brasil – bossa nova”, MPB 4, Som Livre
“Musica Ligeira”, MPB compositores /Gilberto Gil – vol. 8, Som Livre 2000
“Nós 4”, Gal 2004
“Olivia Hime e Francis Hime”, Sem Mais Adeus, Biscoito Fino 2016
“Orquestra de vozes Meninos Do Rio” 2000
“Os morenos”, Serie Melhor De Dois, Universal 2000
“Vargas o interprete do barzinho”, Renato, Deck 2003
“Canto de liberdade”, Mills Records, Ricardo Vilas 2003
“Uma viagem através da música no Brasil”, Solo brasil, Tratore Distribuição de CD 2011
“Sururu na roda made in japan” , Sururu na Roda, Sarapuí Produções Artísticas 2016
“Um banquinho, um violão…”, Tavynho Bonfá, Seven 2006
“T.s. Salve Jorge” , Tim Maia, Som Livre 2012
“Songbook Gilberto Gil 1′ , Tim Mais, Lumiar 1992
“Sucessos em novas versões”, Tim Maia, Lumiar 1999
“MPB tudo vol.1”, Vários, Warner Music, 2009
“Tec toy”, Vidioke, Eletrônica Digital 2000
“Com passo de MPB”, Zeca Pagodinho, Universal Music 2014
“Meses depois de solto, eu vim ao Rio tratar da questão da saída do Brasil com o Exército. Na manhã do dia da minha volta para Salvador, fui visitar Mariah Costa, mãe de Gal; ali, na casa dela, eu ideei e comecei Aquele Abraço. Finalmente eu ia poder ir embora do país e tinha que dizer ‘bye bye’; sumarizar o episódio todo que estava vivendo, e o que ele representava, numa catarse. Que outra coisa para um compositor fazer uma catarse senão numa canção?
“No avião mesmo eu terminei a música, escrevendo a letra num papel qualquer, um guardanapo, e mentalizando a melodia. Tanto que é uma melodia muito simples, quase de blues; como eu não dispunha de instrumento, tive que recorrer a uma estrutura fácil para guardar na memória. Quando cheguei à Bahia, eu só peguei o violão e toquei; já estava comprometido afetivamente com a canção.”
“Aquele abraço, Gil!” – “Era assim que os soldados me saudavam no quartel, com a expressão usada no programa do Lilico, humorista em voga na época, que tinha esse bordão. Ele até ficou aborrecido com a música; achou que deveria ter direito à canção. Mas eu aprendi a saudação com os soldados. Eu não tinha televisão na prisão, evidentemente, mas eles assistiam o programa; eu só vim a ver depois, quando saí.”
Retificação ratificada – Não foi no quartel de Realengo que Gil e Caetano ficaram presos, e sim no de Marechal Deodoro. “De todo modo”, diz Gil, “a idéia em Aquele Abraço era citar um local qualquer da zona norte do Rio (onde ficamos), um daqueles beira-estrada-de-ferro (Beira Central, Beira Leopoldina), e Realengo é um deles. Uma associação inexata, feita por aproximação; eu nem queria me referir ao lugar certo onde havia ficado preso.”
Uma canção de quarta-feira de cinzas – “O reencontrar a cidade do Rio na manhã em que nós saímos da prisão e revimos a avenida Getulio Vargas ainda com a decoração de carnaval foi o pano de fundo da canção. Na minha cabeça, Aquele Abraço se passa numa quarta-feira de cinzas; é quando o ‘filme’ da música é em mim mentalmente locado.”
The three tops – “Aquele Abraço é uma das músicas minhas mais populares, a mais tocada e o segundo mais vendido dos meus discos (compactos). Uma das três gravações minhas que ficaram em primeiro lugar nas paradas de sucesso durante maior tempo (dois meses; eu já estava na Europa). As outras são Xodó (três meses, em 73), da autoria do Dominguinhos e Anastácia, e Não Chore Mais (cinco, em 78), versão que fiz para uma música cantada pelo Bob Marley. Foram as três mais vendidas também.”
5. Oriente (06:10)
Oriente
Gilberto Gil
Se oriente, rapaz
Pela constelação do Cruzeiro do Sul
Se oriente, rapaz
Pela constatação de que a aranha
Vive do que tece
Vê se não se esquece
Pela simples razão de que tudo merece
Consideração
Considere, rapaz
A possibilidade de ir pro Japão
Num cargueiro do Lloyd lavando o porão
Pela curiosidade de ver
Onde o sol se esconde
Vê se compreende
Pela simples razão de que tudo depende
De determinação
Determine, rapaz
Onde vai ser seu curso de pós-graduação
Se oriente, rapaz
Pela rotação da Terra em torno do Sol
Sorridente, rapaz
Pela continuidade do sonho de Adão
BRWMB9901138
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
A “voz” – “Eu e Sandra [Sandra Gadelha, a terceira mulher de Gil] estávamos em Ibiza, na Espanha, numa casinha que tínhamos alugado num bosque de eucalipto. Era um fim de tarde de verão; tínhamos ido à praia e tomado orchata de chufa. Eu estava sentado à porta do chalé, fitando a transição do céu azul para o céu noturno; começavam a surgir as primeiras estrelas. Sandra lá dentro, preparando alguma coisa, e eu ali, quieto. De repente eu vi uma estrela cadente e aquilo me deu interiormente a sensação de uma voz. ‘Se oriente!’ – surgiu essa voz. “Se oriente, rapaz”. Aí eu entrei, peguei papel e lápis, e…”
De como os sentimentos e as reflexões foram nutrindo a inspiração poética e a composição se transformando numa condensação de símbolos – “Da saudade do sul – do hemisfério sul – veio a idéia do Cruzeiro como orientação, como se eu tivesse de me lançar ao mar em busca da redescoberta da minha terra (Cabral, as três caravelas, as navegações: tudo isso vinha à cabeça), desencadeando-se a seguir a meditação sobre a minha situação no exílio, com uma auto-justificação da necessidade da viagem e uma metáfora para o sacrifício da aventura forçada (os navios negreiros, o trabalho escravo no porão dos negreiros; tudo vinha à cabeça e os pensamentos iam sendo sintetizados nos versos).
“O fato de eu ter feito o projeto da familia, a faculdade; de ter recusado uma pós-graduação na Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, para assumir o trabalho na Gessy-Lever e ficar em São Paulo perto de Caetano, de Bethânia, de Gal, do projeto pessoal, a música; e de o trabalho na Gessy-Lever ter sido uma espécie de pós-graduação também, assim como a situação do exílio tinha para mim um significado de pós-graduação… Por tudo isso Oriente é a música minha que eu considero mais pessoal e auto-solidária, mais solitária. Não sou eu em relação a uma mulher ou a uma cidade; sou eu em relação a mim mesmo, a um momento de vida. Back in Bahia também é auto-referente; ela e Oriente são complementares. Minhas músicas da época são assim. Expresso 2222 é meu disco mais elaborado no sentido de relatar um período.”
Atmosfera oriental – “O ‘sorridente’ foi lembrança remota e inconsciente dos versos de Rogério Duarte comigo em Objeto Semi-Identificado: ‘sorridente’ contém ‘oriente’. (O uso do termo ali dá também um alívio em relação ao tom de cobrança de antes: ‘se oriente’, ‘considere’, ‘determine’). O clima do oriente estava no ar: os hare-krishna, os tarôs, os I-Chings. E eu estava num ambiente propício para a referência adâmica do final; Ibiza era o paraíso da contracultura, refúgio de hippies de todo o mundo: europeus, americanos, brasileiros, indianos.”
6. Flora (06:09)
Flora
Gilberto Gil
Imagino-te já idosa
Frondosa toda a folhagem
Multiplicada a ramagem
De agora
Tendo tudo transcorrido
Flores e frutos da imagem
Com que faço essa viagem
Pelo reino do teu nome
Ó, Flora
Imagino-te jaqueira
Postada à beira da estrada
Velha, forte, farta, bela
Senhora
Pelo chão, muitos caroços
Como que restos dos nossos
Próprios sonhos devorados
Pelo pássaro da aurora
Ó, Flora
Imagino-te futura
Ainda mais linda, madura
Pura no sabor de amor e
De amora
Toda aquela luz acesa
Na doçura e na beleza
Terei sono, com certeza
Debaixo da tua sombra
Ó, Flora
BRWMB9901139
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
Outras gravações:
“Música a capela” BR6, Biscoito Fino
“Trem azul”, Elis Regina, Som Livre
“Projeto especial radio musical FM/SP”, Warner Music 1995
“Música a capela”, Biscoito Fino 2004
“MPB compositores – Gilberto Gil vol. 8”, Elis Regina 2000
“Grandes compositores”, Elis Regina, Som Livre
“Bandadois”, Gilberto Gil, Gege Produções Artísticas 2009
“Caixa a conspiração de Gilberto Gil – CD Bandadois”, Gilberto Gil 2010
“Perfil”, Gilberto Gil 2010
“Grandes mestres da MPB”, Gilberto Gil, Warner Music 1997
“Luar”, Gilberto Gil, Warner Music 1997
“Gil grandes mestres da MPB”, Gilberto Gil, Warner Music 1997
“Ao vivo em Toquio”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Nova série”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“Vida”, Gilberto Gil, Warner Music 1984
“Projeto especial Natura”, Gilberto Gil, Warner Music 1996
“The very best of Gilberto Gil the soul Brazil”, Gilberto Gil, Warner Music 2005
“Le trouadour du Brésil”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“Healing select bossa nova”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“Les indispensables de Gilberto Gil”, Gilberto Gil, Warner Music 1989
“Ao vivo em Toquio”, Gilberto Gil & Banda Um, Warner Music 1994
“WR discos”, Mario Ulloa 1998
“Amor até o fim”, Gilberto Gil, Alma Brasileira Produções E Edições 2016
Para Gil, seria difícil não aproveitar a sugestão poética de um nome tão bonitol não aproveitar a sugestão poética de um nome tão bonito “para expressar todo um afeto a partir de uma ‘viagem pelo reino do seu nome’. Eu não resisti. Assim, os elementos e as imagens da canção são todos extraídos do reino vegetal. Flora é como se eu penetrasse no bosque para encontrar a fada.”
Das relações entre música e números e do gosto pela composição dividida em três partes, com sua justificativa – “Fiz as duas primeiras partes [cada parte dividida, na transcrição, em duas estrofes] num dia e, insatisfeito com isso, fiz no outro a terceira, que me satisfaz menos. Aquelas são muito profundas, densas, e a última mais diluída, ornamental – ficou como se fosse de presente pra ela, Flora. Ainda assim achei melhor mantê-la, pela minha mania do três; pela idéia de síntese que o número três dá. Às vezes duas partes são suficientes, mas em geral eu prefiro colocar mais uma, para promover dois deslocamentos semânticos entre as unidades – um, da primeira para a segunda, e outro, da segunda para a terceira. Quer dizer: três (partes) pra dois (movimentos).”
Música-anzol – “Era o verão de 79. Ela estava passando férias em Salvador. Eu a tinha conhecido um mês antes, e nós ainda não namorávamos. Telefonei para um amigo comum. ‘Diga que eu quero vê-la, que vou estar no Teatro Vila Velha entre quatro e seis da tarde. Tenho uma coisa pra mostrar a ela.’ Quando ela chegou, eu cantei a música.
“Flora foi portanto uma cantada literal. Cantei Flora na canção e com a canção. É minha única canção-cantada; que bom que tenha ficado suficiente em beleza e elegância. A alma exigia capricho: o sentimento era intenso, e o desejo, de uma relação durável. O que eu cantava não era só uma pessoa, mas toda uma vida com ela. Na letra eu já a imagino ‘idosa’, ‘bela senhora’, ‘futura’. Elis é que me disse: ‘Nunca uma mulher teve de um homem uma música dessa!’ Uma música em que já se-lhe-oferecia a conformidade a estados que iriam aparecer na sucessão de eventos no tempo.
“A canção teve pra mim, como talvez pra ela, o caráter da irrecusabilidade da proposta. Flora foi além das intenções nela contidas; acabou tendo uma função. A cantada funcionou. É bom que a música e a poesia também tenham essa utilidade. Um modo sutil de ser útil. Uma sutil utilidade; uma ‘sutilidade’…”
Um não-sei-o-que-é – “Há algumas canções na minha obra que me dão a sensação de um deslocamento para um outro plano, onde a poesia tem os seus elfos, as suas ninfas… Flora é uma delas. Ali parece que o ser da paixão se desloca também, usando a canção como se fora instrumento, escrava dele; que o conjunto da habilidade e do talento do indivíduo, eu, estiveram a serviço de uma encomenda feita por uma outra coisa, um ser, em destaque.
“Minha sensação é de que essas músicas (Metáfora é outra; Dada, também) respondem a uma questão que não era minha enquanto artista; em princípio, é como se eu não as tivesse feito. É como se, de repente, através delas eu pudesse ter acesso a uma leve presença de um ser poético que fosse um espírito, um ser da categoria dos transmateriais, para o qual o criador homem fosse cego: o ser das coisas, o ser eterno.
“Eu mesmo não o enxergo e tenho uma grande dificuldade com a apreensão do significado de expressões tais como ‘o espírito do poeta’, ‘o espírito das coisas’; às vezes eu chego perto de alcançá-lo, outras, ele me foge. Parece algo ao mesmo tempo palpável e fugidio; é um negar-se ao afirmar-se, um afirmar-se ao negar-se; é uma coisa… eu não sei realmente o que é…”
– É um não-sei-o-que-é!
Gil: “Um não-sei-o-que-é! Bravo! É esse tipo de natureza que eu atribuo ao tal ser de que falo.”
7. Sarará Miolo (06:37)
Sarará Miolo
Gilberto Gil
Sara, sara, sara, sarará
Sara, sara, sara, sarará
Sarará miolo
Sara, sara, sara cura
Dessa doença de branco
Sara, sara, sara cura
Dessa doença de branco
De querer cabelo liso
Já tendo cabelo louro
Cabelo duro é preciso
Que é para ser você, crioulo
BRWMB9901140
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
guitarra – Gilberto Gil
voz e guitarra – Gilberto Gil
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
8. Banda Um (06:22)
Banda Um
Gilberto Gil
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-iê
Iê-iê-iê-iê
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-ô
(Iô-iô-iô-iô)
Banda Um que toca um balanço parecendo polka
UmBandaUmBandaUm
Banda Um que toca um balanço parecendo rumba
UmBandaUmBandaUm
Banda Um que é África, que é Báltica, que é Céltica
UmBanda América do Sul
Banda Um que evoca um bailado de todo planeta
UmBandaUm, Banda Um
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-iê
Iê-iê-iê-iê
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-ô
(Iô-iô-iô-iô)
Banda pra tocar por aí
No Zanzibar
Pro negro zanzibárbaro dançar
Pra agitar o Baixo Leblon
O Cariri
Pra loura blumenáutica dançar
(Hum…) Banda Um, Banda Um
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-iê
Iê-iê-iê-iê
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô, ô
Banda Um que soa um barato pra qualquer pessoa
UmBanda pessoa afins
Banda Um que voa, uma asa delta sobre o mundo
UmBanda sobre patins
Banda Um surfística nas ondas da manhã nascente
UmBanda, banda feliz
Banda Um que ecoa uma cachoeira desabando
UmBandaUm, bandas mis
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-iê
Iê-iê-iê-iê
BandaUmBandaUmBandaUmBanda – ô-ô
(Iô-iô-iô-iô)
BRWMB9901141
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
Outras gravações:
“Bandadois”, Gilberto Gil, Gege Produções Artísticas 2009
“Um banda um”, Gilberto Gil 1993
“Ao vivo em Toquio”, Gilberto Gil, Warner Music 2002
“Um banda um”, Gilberto Gil, Warner Music 2009
A umbanda – “O sentido universalista da umbanda como uma cisão do culto fechado das religiões, seja candomblé, seja a católica, ambas monistas, cada uma com a sua verdade; o panteísmo necessário da umbanda, uma religião que não é uma mas ‘todas’, misturando o kardeccismo, o catolicismo, o politeísmo africano. (E Banda Um é uma música-síntese com uma intenção e um conceito panculturalista, uma canção que cultiva as idéias de música, de juventude, de comportamento, de consumo e de vários nacionalismos.)”
A Banda Um – “E, ao mesmo tempo, o fato de sermos um pouco a Banda do Zé Pretinho [Gil se refere aqui ao grupo de Jorge Benjor, ao qual compara o seu]: Banda Um é como se fosse o nosso hino, o nosso prefixo musical.”
A UmBandaUm – “Banda Um é uma coisa, e umbanda é outra, exatamente o oposto: Banda Um é uma banda; umbanda são todas as bandas – ou nenhuma, em princípio. ‘UmBandaUm’ [a repetição seguida de ‘Banda Um’ no verso faz ressoar a palavra ‘umbanda’] estabelece o jogo dos contrários: faz o embutimento mútuo dos dois sentidos.
“A descoberta de todas essas coisas me animou à escolha, embora eu tenha hesitado muito em optar por Um Banda Um para nomear o disco e me apaziguar com a idéia de fazer esse tipo de brincadeira (que às vezes pode ficar gratuito; mas quando você descobre uma solução que, embora fácil, esteja carregada de sentido, e esse era o caso – ‘umbanda’ é uma palavra com uma carga enorme no Brasil -, aí, tudo bem). Acabei topando.”
Palavras-valise – ” ‘Zanzibárbaro’: do Zanzibar, um bar de negros, da Federação (bairro de Salvador). A loura ‘blumenáutica’: de Blumenau, e ao mesmo tempo náutica (a referência, embutida, aos esportes aquáticos, ao surfe, à juventude, ao mar, ao verão). Palavras-valises. Nelas cabe um bocado de idéias: você vai botando. É um dos procedimentos concretistas que mais me interessam. A invenção da palavra que é um condensado de significados.”
9. Touché Pas a Mon Pote (04:25)
Touché Pas a Mon Pote
Gilberto Gil
Touche pas à mon pote
Ça veut dire quoi?
Ça veut dire peut être
Que l’Être qui habite chez lui
C’est le même qui habite chez toi
Touche pas à mon pote
Ça veut dire quoi?
Ça veut dire que l’Être
Qui a fait Jean-Paul Sartre penser
Fait jouer Yannik Noah
Touche pas à mon pote
Il faut pas oublier que la France
A déjà eu la chance
De s’imposer sur la terre
Par la guerre
Les temps passés ont passé
Maintenant nous venons ici
Chercher les bras d’une mère
Bonne mère
Touche pas à mon pote
Touche pas à mon pote
Ça veut dire quoi?
Ça veut dire peut être
Que l’Être qui habite chez lui
C’est le même qui habite chez toi
Touche pas à mon pote
Ça veut dire quoi?
Ça veut dire que l’être
Qui a fait Jean-Paul Sartre penser
Fait jouer Yannik Noah
Il fait chanter Charles Aznavour
Il fait filmer Jean-Luc Goddard
Il fait jolie Brigitte Bardot
Il fait petit le plus grand Français
Et fait plus grand le petit Chinois
Touche pas à mon pote
BRWMB9901142
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado e acordeon – Ricardo Cristaldi
“Eu tinha ido ao evento do movimento SOS Racismo, na Place de la Concorde, em Paris, e, lá, sido convidado a (e aceitado) participar da edição do mesmo no ano seguinte, marcada para a praça da Bastilha. Ao voltar ao Brasil – com o slogan deles, o ‘touche pas à mon pote’ (‘não incomode meu chapa’), na cabeça -, resolvi fazer a canção.
“O que faz o Sartre pensar faz o Yannik Noah jogar (Noah: jogador de tênis de origem africana, exemplo de imigrante bem-sucedido na França). Ou: ‘Como é que vocês, povo da Liberdade, da Igualdade e da Fraternidade, se deixam rebaixar por tamanha mesquinharia? Isso é coisa de Hitlers, não de vocês!’ É a exortação da canção à alma francesa, às suas grandes máximas cívicas – recorrendo particularmente ao truque de usar essa entidade tão importante que é o ‘ser’, que diz respeito profundamente à obra de Sartre -, para tocar na questão da intolerância racial.
“Meu francês era limitado, mas ainda assim eu quis ousar fazer, e acabei me deparando com essas surpresas que o próprio desdobrar-se da manifestação da poesia acaba trazendo. Essa música é particularmente um típico exemplo de que as deficiências no domínio de uma língua podem ser superadas pela excelência da linguagem. A canção se tornou conhecida na França. Os franceses ficaram admirados de ver que um fenômeno interno deles pudesse ter sido revelado a partir de fora; vários jornalistas me disseram: ‘Mas como que é que você fez?’ ‘Eu fiz’.”
10. Toda Menina Baiana (04:47)
Toda Menina Baiana
Gilberto Gil
Toda menina baiana tem um santo, que Deus dá
Toda menina baiana tem encanto, que Deus dá
Toda menina baiana tem um jeito, que Deus dá
Toda menina baiana tem defeito também que Deus dá
Que Deus deu
Que Deus dá
Que Deus entendeu de dar a primazia
Pro bem, pro mal, primeira mão na Bahia
Primeira missa, primeiro índio abatido também
Que Deus deu
Que Deus entendeu de dar toda magia
Pro bem, pro mal, primeiro chão na Bahia
Primeiro carnaval, primeiro pelourinho também
Que Deus deu
Que Deus deu
Que Deus dá
BRWMB9901183
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
“Feita em Salvador, ao lado da Nara, minha filha mais velha, que estava na pré- adolescência, a música é pra ela e por causa dela. Fala do caráter fundador da Bahia e das virtudes e defeitos do homem. Por força da busca de compreensão do divino no humano, eu me empenhava em me desvencilhar do maniqueísmo, abarcando as idéias ligadas tanto ao bem quanto ao mal. De lá pra cá esse ficou sendo um tema básico de minhas canções. Quase todas exprimem a necessidade de reiterar o sentido da tolerância, do perdão, da compreensão de que o homem é permeado pelo bem e pelo mal e de que a superação de um implica a superação do outro; você não se livra do mal sem se livrar do bem. A promessa das religiões reside nisso: na superação transcendental de ambos.”
11. Não Chores Mais (06:43)
Não Chores Mais
Gilberto Gil
Bem que eu me lembro
Da gente sentado ali
Na grama do aterro, sob o sol
Ob-observando hipócritas
Disfarçados, rodando ao redor
Amigos presos
Amigos sumindo assim
Pra nunca mais
Tais recordações
Retratos do mal em si
Melhor é deixar prá trás
Não, não chore mais
Não, não chore mais
Bem que eu me lembro
Da gente sentado ali
Na grama do aterro, sob o céu
Ob-observando estrelas
Junto à fogueirinha de papel
Quentar o frio
Requentar o pão
E comer com você
Os pés, de manhã, pisar o chão
Eu sei a barra de viver
Mas se Deus quiser
Tudo, tudo, tudo vai dar pé
Tudo, tudo, tudo vai dar pé
Tudo, tudo, tudo vai dar pé
Tudo, tudo, tudo vai dar pé
Não, não chore mais
Não, não chore mais
BRWMB9901184
© Gege Edições Musicais
Ficha técnica da faixa:
voz e guitarra – Gilberto Gil
guitarra – Celso Fonseca
percussão – Repolho
baixo – Rubens Sabino (Rubão)
bateria – Jorge Gomes
sopros – Raul Mascarenhas
sopros – Paulinho Trompete
sopros – Sérgio Trompete
teclado – Ricardo Cristaldi
Outras gravações:
“Liebe paradiso”, Celso Fonseca e Ronaldo Bastos part. João Donato, Dubas Musica 2011
“Balé mulato ao vivo”, Daniela Mercury, Páginas do mar 2006
“Banda Larga ao vivo em São Paulo”, Gilberto Gil, Gege Produções Artísticas 2008
“Perfil”, Gilberto Gil, Sigla 2005
“Nova série”, Gilberto Gil, Warner Music 2007
“Eletracústico”, Gilberto Gil, Warner Music
“Realce”, Gilberto Gil, Warner Music 1988
“Mestres da MPB”, Gilberto Gil, Warner Music 1992
“Gilberto Gil – original album series”, Gilberto Gil, Warner Music 2012
“Bandadois”, Gilberto Gil, Warner Music 2010
“Natiruts 2015”, Natiruts, Zeropontodois Entretenimento 2015
“Povo das estrelas – 30 anos de samba, reggae e cidadania”, Olodum, João Jorge Santos Rodrigues 2015
“A festa rock”, Rodrigo Santos, Coqueiro Verde Records 2015
“Um barzinho, um violão – melennium”, Sandra De Sá, Universal Music 2004
[ No Woman, No Cry, de B. Vincent]
“Eu pensava na transposição de uma cena jamaicana para uma cena brasileira a mais similar possível nos aspectos físico, urbano e cultural. Emblemática do desejo de autonomia e originalidade das comunidades alternativas, No Woman, No Cry retratava o convívio diário de rastafaris no ‘government yard’ (área governamental) em Trenchtown, e a perseguição policial, provavelmente ligada à questão da droga (maconha), que eles sofriam. Esta situação eu quis transportar para o parque do Aterro, no Rio de Janeiro, também um parque público, onde localizei policiais em vigília e hippies em rodinhas, tocando violão e puxando fumo, como eu costumava vê-los de noite na cidade. Coincidindo com o momento em que a abertura política estava começando, Não Chore Mais acabou por se referir a todo um período de repressão no Brasil.”
“Não chore mais” – “Minha tradução para o refrão-nome foi uma escolha arbitrária, porque eu nunca entendi direito o que os autores queriam dizer com o proverbial ‘no woman, no cry’. Até procurei, mas não tive meios de saber. Alguns me disseram que a expressão significa ‘nenhuma mulher, nenhum problema’; eu pensei em ‘nenhuma mulher, nenhum choro’, um adágio local talvez. E também numa possível forma em inglês dialetado para o correto ‘no, woman, don’t cry’.
“Optei por algo próximo disso inclusive porque, assim, eu me aproximava mais do sentido dos outros versos da música, uma espécie de lamento pela perda dos amigos e pela presença pertubadora da repressão que, na versão pelo menos, adquire um ar de canção de despedida, com o homem dizendo à mulher que está indo embora, mas que isso não é o fim do mundo, e que é pra ela se lembrar do tempo dos dois juntos etc. Uma instauração de um espaço afetivo que eu até hoje não sei se o original contém.”
“Amigos presos, amigos sumindo assim, pra nunca mais” – “Eu não pensava em ninguém especificamente; a tradução vinha diretamente dos versos em inglês, com o detalhe do uso do termo ‘presos’ – surgido naturalmente com a lembrança do modo de atuar da repressão, através das prisões, torturas e mortes de pessoas.”
“Melhor é deixar pra trás” – “Há uma certa licenciosidade interpretativa aí. ‘You can’t forget your past’ (‘Você não pode esquecer o seu passado’), diz o original. Me referindo ao período que estava terminando no Brasil, eu digo: ‘Vamos passar a borracha nisso tudo. O passado tem um débito conosco, mas vamos dar um crédito ao futuro’. Uma posição típica da minha ideologia interna, do meu otimismo, do meu gosto pela conciliação, do traço tolerante da minha personalidade.”