A música festejada em cada artista

Sílvio Osias, a quem conheço há muitos anos e por quem cultivo sincera amizade, não é o que, a rigor, podemos considerar um crítico musical. Apaixonado pela música popular nas suas mais diversas formas de manifestação, apreciador da diversidade de gêneros e atitudes musicais, defensor da liberdade, do arrojo e da audácia experimentativa de alguns, […]

Sílvio Osias, a quem conheço há muitos anos e por quem cultivo sincera amizade, não é o que, a rigor, podemos considerar um crítico musical. Apaixonado pela música popular nas suas mais diversas formas de manifestação, apreciador da diversidade de gêneros e atitudes musicais, defensor da liberdade, do arrojo e da audácia experimentativa de alguns, mas apreciador, também, dos modos moderados e perseverantes de outros tantos, Sílvio pode acolher, em seu coração sensível, tanto a admiração por um Hermeto Pascoal irrequieto e rabugento quanto por um plácido e correto Dominguinhos. Sílvio sempre procurou compreender a contribuição genuína dos artistas, buscando adivinhar em cada um o destino por trás do propósito, o êxtase por trás do êxito, o senso de missão por trás do fracasso. Sílvio sempre procurou, nos artistas que aprecia, o amor que lhes inspira, a inteligência que lhes propicia o encontro da novidade eficaz e a espiritualidade inerente ao teor poético de tudo que cantam e tocam.

Disse-me Sílvio, a respeito das crônicas musicais aqui reunidas, que elas foram todas escritas para apreciar trabalhos ou conjuntos de obras de artistas de quem ele gosta. “Se eu não me sinto inclinado a falar bem, então, não falo mal”, sentenciava ele numa conversa no camarim de um show no Recife, há alguns meses, quando me apresentou o material deste livro para que eu, eventualmente, escrevesse algo a respeito – um prefácio se eu me dispusesse ou um simples punhado de palavras sobre os escritos, se só isso me permitissem o tempo e a disposição. Seguramente, não me faltou a disposição, haja vista o carinho que tenho tanto pelo escritor quanto pelos escritos. O tempo, este, no entanto, já não foi tão generoso, haja vista a minha agenda alucinada. Afinal só me foi possível escrevinhar este simples punhado de idéias sobre o fato de Sílvio ter feito este livro.

Espero que o leitor leia este livro como quem aprecia a coleção de um filatelista: ao colecionador de selos importa menos o valor de cada selo e mais a beleza generosa da coleção. Ao Sílvio também, parece-me, importa mais que a música seja festejada em cada artista, não importa o artista. Sílvio ama a música e sabe que o todo é maior que a soma das partes. Os músicos são apenas astros no cosmos deslumbrante da musa. Eles são meros fragmentos da música. Só ela é a pedra preciosa inteira.

in Meio Bossa Nova, meio Rock’n Roll. Sílvio Osias. Edição do autor, 2001.

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Gilberto Gil