Uma gestão para a cultura e o pensamento

Em 2005, o MinC (Ministério da Cultura) propôs um programa de alcance nacional para ativar a discussão pública em torno de temas da agenda intelectual contemporânea: “Cultura e Pensamento em Tempos de Incerteza”. Em 2006, o programa será ainda mais inovador na maneira como amalgama iniciativas e anseios do poder público, da sociedade e dos […]

Em 2005, o MinC (Ministério da Cultura) propôs um programa de alcance
nacional para ativar a discussão pública em torno de temas da agenda
intelectual contemporânea: “Cultura e Pensamento em Tempos de Incerteza”.
Em 2006, o programa será ainda mais inovador na maneira como amalgama
iniciativas e anseios do poder público, da sociedade e dos segmentos
culturais do país, com o espírito aberto e democrático que tem guiado
nossos atos.

Não há nele respostas circunstanciais a críticas que qualquer gestão
recebe por causa de suas escolhas. O programa insiste em uma forma
avançada de republicanismo ao conceber as políticas culturais e está em
consonância com o modo de trabalhar com a sociedade que tem marcado a
conduta do MinC desde o princípio desta gestão.
Para os debates deste ano, preliminarmente, em levantamento atencioso,
foram eleitos os assuntos que têm marcado nossa produção universitária, o
meio editorial, pautas críticas da imprensa, manifestações de grupos
culturais e organizações sociais.
Contribuindo para dinamizar a reflexão pública, o Ministério da Cultura já
trabalha em quatro projetos que devem cobrir alguns temas de pertinência
reconhecidamente atual. Teremos ainda outros quatro seminários,
completando a série, apoiados pela Petrobras por meio de editais, e para
os quais estamos convocando a sociedade a propor abordagens dos seguintes
temas:
1) Biopolítica e tecnologias: padrões contemporâneos de emancipação,
propriedade, dominação e controle.
2) Populações e territórios: o global, o nacional e o local no
agenciamento de identidades e na diversificação da cultura.
3) Os usos e abusos do público e do privado na cultura política dos tempos
atuais.
4) Lógicas e alternativas para as dinâmicas culturais no centro da
economia e da sociedade.
Esses eixos temáticos, propostos de início, serão ainda desenvolvidos em
reuniões públicas com pensadores convidados a intervir na proposta
original durante a preparação dos editais. Uma vez reelaboradas, as pautas
serão abertas à apresentação de propostas, e uma comissão de reconhecido
valor escolherá projetos.
Já que todo esse processo foi pensado como diálogo constante, a
interlocução não acaba aí, pois, após a seleção, os proponentes escolhidos
debaterão seus projetos em um fórum de discussões com outros pensadores do
Brasil e do mundo: só então serão implementados, e a vocação democrática
dessa iniciativa será coroada com a realização do ciclo de debates em
diversas cidades do país.
Peço a todos que se informem mais no site do MinC (www.cultura.gov.br),
que estará aberto à contribuição de todo cidadão brasileiro e acolherá
opiniões sobre os assuntos.
A expectativa desta gestão, com essa e outras ações, sempre foi legar a
nossa sociedade um aprimoramento dos mecanismos de fomento à atividade
cultural. Mais ainda, aprimorar a própria circulação de valores entre as
regiões e esferas tão várias que formam o Brasil.
Esse foi o desejo que nos autorizou a embarcar na aventura incerta e
delicada de assumir um ministério. Nos recusamos a enxergar o
financiamento público como mero recurso ao qual se pode recorrer para a
realização de projetos particulares; tampouco cabe ao governo solicitar a
profissionais da cultura a execução de tarefas definidas. O Brasil só
avançou nos raros momentos em que essa distorção foi enfrentada. O
espírito do Minc tem sido apenas esse, embora a desinformação
freqüentemente embaralhe as cartas a respeito do que tem sido feito e nos
apresente como semelhantes ao nosso avesso.
Em um país em que o Estado cavou para si a fama de agente que não só não
ajuda como também estorva e onera os poucos que têm iniciativa, é natural
que enfrentemos resistência e antipatia eventuais: somos uma sociedade com
aversão ao poder e ao Estado muito antes de qualquer ideologia preconizar
o seu desaparecimento completo. A repetição de arbítrios e ditaduras e os
abusos a que tantas vezes assistimos confundem, por vezes, o nosso
justíssimo horror ao totalitarismo com a vaga rejeição a qualquer política
pública e à criação de normas republicanas.
Neste momento bastante especial, esperamos que esse processo também seja
assunto para debate. Não pode haver maior ganho para a gestão que ampliou
as noções de política cultural vigentes do que chegar a refletir
inventivamente sobre a própria cultura política do país.

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Gilberto Gil