Músicas
Umeboshi
Gilberto Gil
Como a flor de lótus é
Uma bomba poderosa
Como a pomba-gira é
Estimulante do apetite
Elixir contra a bronquite
Regulador da mulher
Base da saúde púbica
Saúde dois mil e única
Saída contra a maré
Umeboshi cura qualquer saúde
Umeboshi cura qualquer doença
Umeboshi cura tudo porque veio do Japão
Foi cultivada na terra
Onde teve uma explosão
“Eu quero paz e arroz
Amor é bom e vem depois”
Como disse o meu amigo Jorge muito Ben
No mais é Deus no céu da boca e nada mais
(Conheci meu amigo na beira do cais
Perguntei se ele iria
Ele disse: “O Senhor vai
Descer do céu na terra uma vez mais”
Eu pensei: “Quem diria”
Ele disse: “O Senhor vai”
Eu falei qualquer coisa
Ele sumiu do cais
Partiu dali para sempre
Para nunca mais
E quando eu chego em casa
Dá, pai
Dá, mãe
Dá cá
Dá cá
Dá cacun dá, dá, dá
Dá cacunda, dá, dá
Dá cacunda pro menino
Pro menino não chorar
Faz a cama da menina
Que a menina quer deitar
Dá cacunda, dá, pai
Dá cacunda, dá, mãe
Dá cacunda pro menino
Pro menino não chorar
Faz a cama da menina
Que a menina quer deitar)
Umeboshi
Ameixinha salgada
Três anos curtida
Três anos curada
No sal
De curtida
De curada
Cura
Cura qualquer doença
Cura qualquer saúde
Umeboshi
Ameixinha salgada
(Salgada paca)
Umeboshi é fruto da flor
Como a flor de lótus é
Uma bomba poderosa
Como a pomba-gira é
Gravações
Gilberto Gil – Cidade do Salvador, Vol. 1, 1973 – Gege
Gilberto Gil – Ao Vivo na USP, 1973 – Gege
Comentário*
Como “Jurubeba” e “Pílula de alho”, essa é mais uma das minhas canções que tratam dos alimentos com qualidades medicinais, do alimento como fonte de saúde, como remédio mesmo. “Umeboshi” foi composta para falar da eficácia da ameixa japonesa homônima, muito usada na macrobiótica.
“Umeboshi cura qualquer saúde”: o verso, aparentemente paradoxal, se relaciona com a ideia do professor Tomio Kikuchi [o introdutor da macrobiótica no Brasil], para quem “só tem saúde quem fica doente; sem doença, não há saúde”. Quer dizer, quem estiver se sentindo muito saudável, tem que se curar disso… A ideia remete para a visão do equilíbrio como pura dinâmica, não como situação estática.
“Eu quero paz e arroz/ Amor é bom e vem depois” é citação de uma música do Jorge Ben. “Deus no céu da boca” é uma referência ao hábito e à recomendação de deixar a umeboshi se dissolvendo na boca, quando se está tratando de algum problema com ela. O diálogo, na estrofe final, é um procedimento formal que será retomado depois em “Abra o olho”.
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil
Uma Coisa Bonitinha
Gilberto Gil
João Donato
Que é mamãe
Outra coisa ainda mais bonitinha
Que é vovó
Mamãe,
Numa blusa larga de tricô
Vovó,
Numa blusa justa de crochê
Mamãe,
Bem apertadinha no maiô
Vovó,
Num biquinizinho, que mulher
Mamãe,
Um rostinho Michelangelo
Vovó,
Um corpinho estilo Caribé
Mamãe,
Usuária assídua do metrô
Vovó
Bicicleta sempre que puder
Mamãe,
Elegante sempre na maior
Vovó,
Escrachada, hippie, bem lelé
Mamãe,
Materialista de bom tom
Vovó,
Idealista da cabeça ao pé
Mamãe,
Eu já sei o que que eu vou fazer
Vovó,
Vou acabar morando com você
Gravação
Gilberto Gil – OK OK OK, 2018 – Gege
Comentário*
Uma música que eu fiz com o Donato um dia na casa dele, há uns vinte e cinco anos [em 1997, segundo o pesquisador Marcelo Fróes]. A música, daqueles minimalismos típicos do Donato. A gente ficou nela durante horas, brincando, improvisando, derivando melodias, e ele a gravou no cassete, que se perdeu completamente. Um dia o Marcelo Fróes encontrou essa fita e me deu. Eu disse: “Olha! Vou brincar com isso aqui”. A mamãe e a vovó. Dá um contraste de gerações… Já havia a melodia toda, eu fui desenvolvendo a letra. A mamãe bonitinha e a coisa ainda mais bonitinha que é a vovó. E vovó então é aquela figura extraordinária, mais avançada do que a filha. E as imagens vão surgindo… No imaginário, a filha é gorduchinha, e a vó não: é toda esbelta ainda, apesar da idade. E prefere andar de bicicleta. No fim, é um pouco como se o filho almejasse que a vó fosse a sua mãe. A canção recompõe, restaura o mito da vó como a mãe maior, a mãe qualificada. O neto é o filho sem problemas, então a vó é a mãe sem problemas. Nesse sentido. A filha ainda nutre uma racionalidade, um enquadramento mínimo num modelo; é mais modelada. E a vó é solta, já está liberada. No fim, a declaração do filho: “Tudo bem, minha mãe, eu agradeço, você me criou, muito legal, mas minha noção mais paradisíaca de espaço doméstico, digamos assim, é a casa da vó. Então, já sei o que eu vou fazer: vou morar com a vovó”.
Já que eu me dispus a estender aquele refrão de anos antes que a gente tinha feito numa brincadeira, numa tarde, pensei: como é que eu vou estender isso aqui? Como é que eu vou elaborar essa mãe e essa vó aqui? E eu fiz a letra pensando um pouco em mim e no Donato como irmãos, filhos dessa mãe, netos dessa avó — e no lado espontaneísta, aberto, nada enrijecido, da música do Donato, dentro de uma tradição de várias canções de brincadeira, quase infantis, juvenis, nossas. Esses sentimentos todos foram chegando ali, na hora de ampliar a canção para além do refrão. E eu fui fazendo essa livre associação de contrastes.
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil
Um trem para as estrelas
Gilberto Gil
Cazuza
Vejo o Cristo, da janela
O sol apagou sua luz
E o povo lá embaixo espera
Nas filas dos pontos de ônibus
Procurando aonde ir
São todos seus cicerones
Correm pra não desistir
Dos seus salários de fome
É a esperança que eles têm
Nesse filme como extras
Todos querem se dar bem
Num trem pras estrelas
Depois dos navios negreiros
Outras correntezas
Meu nego
Num trem pras estrelas
Depois dos navios negreiros
Outras correntezas
Meu nego
Estranho, teu Cristo, Rio
Que olha tão longe, além
Tem os braços sempre abertos
Mas sem proteger ninguém
Eu vou forrar as paredes
Do meu quarto de miséria
Com manchetes de jornal
Pra ver que não é nada sério
Eu vou dar o meu desprezo
Pra você que me ensinou
Que a tristeza é uma maneira
Da gente se salvar depois
Num trem pras estrelas
Depois dos navios negreiros
Outras correntezas
Meu nego
Num trem pras estrelas
Depois dos navios negreiros
Outras correntezas
Meu nego
Gravação
Gilberto Gil e Cazuza – Um trem para as estrelas (filme de Cacá Diegues, 1987) – Globo/Som Livre
Um sonho
Gilberto Gil
Que eu estava certo dia
Num congresso mundial
Discutindo economia
Argumentava
Em favor de mais trabalho
Mais emprego, mais esforço
Mais controle, mais-valia
Falei de pólos
Industriais, de energia
Demonstrei de mil maneiras
Como que um país crescia
E me bati
Pela pujança econômica
Baseada na tônica
Da tecnologia
Apresentei
Estatísticas e gráficos
Demonstrando os maléficos
Efeitos da teoria
Principalmente
A do lazer, do descanso
Da ampliação do espaço
Cultural da poesia
Disse por fim
Para todos os presentes
Que um país só vai pra frente
Se trabalhar todo dia
Estava certo
De que tudo o que eu dizia
Representava a verdade
Pra todo mundo que ouvia
Foi quando um velho
Levantou-se da cadeira
E saiu assoviando
Uma triste melodia
Que parecia
Um prelúdio bachiano
Um frevo pernambucano
Um choro do Pixinguinha
E no salão
Todas as bocas sorriram
Todos os olhos me olharam
Todos os homens saíram
Um por um
Um por um
Um por um
Um por um
Fiquei ali
Naquele salão vazio
De repente senti frio
Reparei: estava nu
Me despertei
Assustado e ainda tonto
Me levantei e fui de pronto
Pra calçada ver o céu azul
Os estudantes
E operários que passavam
Davam risada e gritavam:
“Viva o índio do Xingu!
“Viva o índio do Xingu!
Viva o índio do Xingu!
Viva o índio do Xingu!
Viva o índio do Xingu!”
Gravação
Gilberto Gil – Parabolicamará, 1991 – Warner Music
Comentário*
Modas de viola em geral têm uma narrativa linear, contam uma história com começo, meio e fim muito nítidos, são românticas, sentimentais, narram uma vicissitude amorosa, uma mulher que foi embora ou um crime passional, alguém que deu um tiro no outro ou histórias ligadas à família, casos de dificuldades na família, o filho que vai embora para trabalhar, a mãe que morre, alguém na cancela da estrada, o menino da porteira.
“Um sonho” é talvez minha única moda de viola, estruturada em quadras como manda o figurino clássico, mas com uma linguagem e um desenrolar de poesia de cordel. É maluca. A entrada do velho na história vira o discurso de ponta-cabeça, o sentido espiritual se sobrepondo ao materialista pragmático; na letra, passa a viger o contraponto artístico, o sonho mesmo.
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil
Um samba
Gilberto Gil
João Donato
O prazer à sombra num sol de verão
Repouso
No samba
Não ouso pedir mais do meu violão
Que as asas
De um samba
Prum voo na nave da inspiração
E um pouso
Suave
No telhado estrelado de um barracão
Da imaginação
Um samba
Tomara que as eras que ainda virão
E as feras
Uivantes
Dos alto-falantes da nova canção
Devorem
De um samba
As vísceras cruas de fogo e paixão
E as ruas
Repletas
Celebrem tambores de um mundo pagão
De um samba
Gravação
Leila Pinheiro – Olho nu, 1986 – Philips
Comentário*
O Donato me mandou uma fitinha com essa música, e eu escrevi a letra pra ela quando estava fazendo “Punk da periferia”; no meio do processo de uma série de canções que eu estava fazendo na época. É uma exortação aos roqueiros, aos novos músicos, aos novos tempos. “Ouçam o samba, vejam o samba.” Uma mensagem para as novas gerações: “As feras uivantes dos alto-falantes da nova canção”. O endereçamento é muito explícito: a canção está falando para os meninos.
Que já estavam intensificando seu gosto, seu consumo de rock, no Brasil. — Isso mesmo. E eu, inclusive, também pertencendo a essa deriva. Mas ao mesmo tempo ali ainda apegado à paixão pelo samba, pelos tambores. Pelas “vísceras cruas” que eu digo, de algo irrecusável, que é… samba-rock. Trata-se de uma apologia ao samba-rock.
A primeira estrofe ainda não alude ao rock; fala do samba. E cita, no último verso, “Chão de estrelas”. — Exatamente. Contemplando o universo original, cultural do samba, a cultura de onde ele vem, no Brasil, a música se refere a “Chão de estrelas”. E na segunda parte faz a ponte com “os alto-falantes”. Samba- -rock. Subtítulo: “Samba-rock”.
A composição não difere de outras do Donato, como “Lugar comum”, de uma arquitetura mais sintética, econômica? — Sim… mas ao mesmo tempo são justaposições, colagens, montagens, edições de frases que são muito dele [Gil mimetiza com palmas e onomatopeia — pambambam pambambam pambumbê — a música de Donato]. São aquele jeito dele de buscar beber da tradição. À moda de Jobim também. O que talvez dê a sensação de distanciamento da arquitetura composicional da música é a própria letra.
Ah, sim. Porque ela tem frases relativamente longas; são vá- rios versos que compõem uma sentença só; o sentido de um verso vai se completando no seguinte. — Isso mesmo. São versos mais do que dodecassilábicos. Têm quinze, dezesseis sílabas… Eles vão dando a sensação de uma discursividade musical que, na verdade, é da própria letra; mais da letra do que da música.
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil
Um riacho, um caminho
Gilberto Gil
Dominguinhos
Foram tantos os enganos, foram tais
As ilusões cruéis, as confusões banais
Foram tantos olhos de crianças, tantos risos de esperança
Que no fundo tanto faz
Se voltarão depois, se ficarão pra trás
Dito assim, parece que o coração esquece
O que merece da lembrança gratidão
Não é isso não, não é isso não.
Veja, o coração tem seu capricho, mesmo
O que já foi pro lixo da memoria, nele não
Pois nele a história está no cofre da emoção
Há por exemplo, cenas que ainda contemplo, como um telão
Pra sentir que era assim
Mesmo assim, bem assim
Aquele riacho sempre, sempre indo
Aquele caminho sempre a me levar
Então eu vim parar, parar bem aqui.
No entanto, quase tudo que eu canto
Não tem canto certo, não tem tempo nem lugar
É pra você ouvir, é pra você sonhar
O riacho, meu riacho, seu riacho
Meu caminho, seu caminho, tudo só canção
Só pra você guardar dentro do coração
Gravação
Gilberto Gil – Fé na festa (Ao vivo), 2010 – Gege
Comentário*
Dominguinhos já chegou com esse título. Ele fez a música e deu nome a ela. Ele disse: “Nego veio, é um riacho, um caminho. Escreve aí”. Pronto, aí foi só desenvolver, assumir a persona dele. Assumir “um riacho, um caminho” como duas instâncias dos vários instantes dele. A melodia já propunha todos os tais caminhos, já “eram” um córrego, já tinha esse fluir do riacho, essa ideia de desaguar, de tudo isso.
“E no fundo tanto faz/ Se voltarão depois, se ficarão pra trás”: de novo o jogo contrastante que eu gosto de manter: nada anda só pra frente, nada vai só adiante; a história de passado e futuro de que já falamos [a propósito de “Não tenho medo da vida” (além de “Estrela azul do céu”)]. E havia ainda o fato de que ele, também como o Rogério, tinha o viver já fragilizado. Morreu pouco tempo depois. Mas ouviu a canção e chegou a tocá-la e cantá-la comigo, na gravação do Fé na festa ao vivo. Foi a última vez que nós cantamos, tocamos juntos.
“Quase tudo que eu canto/Não tem canto certo/Não tem tempo, nem lugar”: a ideia do canto como um lugar também. [A letra] Falando do canto cantar e o canto lugar. Aquele lugar angular entre duas paredes.
Você fez a letra procurando incorporar a vivência do Dominguinhos. Do músico, compositor e cantor que vai viajando e volta, volta aos mesmos lugares. — Do retirante… É tudo isso.
Do músico falando com seu ouvinte também. — Da construção da sucessão de frases, do fraseado, da narrativa da canção. Toda a letra já era inspirada no fio melódico qual um riacho.
Como era compor com o Dominguinhos? — Era muito interessante. Desde “Lamento sertanejo”, a primeira. Depois “Abri a porta” [lançada por A Cor do Som]. Foram poucas e boas canções com ele. E teve as que não cheguei a compor, mas que “criei”, como se dizia antigamente, “fiz a criação”. “Xodó” e “Tenho sede”, ambas dele com a Anastácia, mas que eu “criei”, isto é, gravei-as.
Dois parceiros seus que se sobressaem como grandes músicos, mas que são muito diferentes, são, justamente, o Dominguinhos e o João Donato. — Muito diferentes. Mas ambos com essa densidade propriamente musical, sem necessidade de desbordar pra outro campo que não a melodia, a harmonia e o ritmo. Todos satisfeitos com a sua própria condição de músico, sua capacidade de desempenhar.
Os dois não faziam letra nunca. Só música mesmo. Mas quanta música! — Muita música, incrível!
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil
Um carro de boi dourado
Gilberto Gil
Francis Hime
Surgiu na estrada gemendo
Gemendo um doce gemido
Vozes lhe seguindo o som
Bois elegantes puxando
Rodas de luzes piscando
Um carro de boi neon
Um carro de boi neon
Um carro de boi neon
Um carro de boi dourado
Fluorescente, iluminado
Trazendo Touro Sentado
Sentado ao lado de Trom
Buda sorrindo calado
Admirando o machado
Empunhado por Xangô
Os anjos celestiais
Os campeões mundiais
Nobres de Roma e de Atenas
Escravas louras, morenas
Todos desfilando atrás
Soldados, sábios, mucamas
Alfarrábios, fliperamas
Tudo desfilando atrás
Atrás do carro de boi
Atrás do carro de boi
Como na escola de samba
O bamba e o super-herói
Como na escola de samba
O bamba e o super-herói
Um carro de boi dourado
Passou na estrada gemendo
Trazendo os deuses e o som
Um carro de boi neon
Um carro de boi neon
Gravações
Francis Hime – Essas parcerias, 1984 – Elenco/Opus
Gilberto Gil e Francis Hime – Duetos 2, 2008 – Warner Music
Comentário*
Uma canção que eu fiz com o Francis Hime. Ele me mandou uma música e eu fui pondo a letra. É engraçado porque é uma letra tão cheia de caminhos… Carnavalesca, num certo sentido. — Não sei em que sentido.
Por causa das imagens que ela lança. Que têm a ver com carros alegóricos. — Sim, tem esse lado. Parece que esse carro está num desfile, que poderia ser um desfile de Carnaval. Com as grandes sociedades… Com os trios elétricos bem ornamentais dos primeiros tempos.
Mas você não estava pensando nisso, ao compor? — Não. Mas qualquer coisa como a ideia de uma locação como num filme, como eu tinha com a Boca do Rio de “Domingo no parque”, é possível, sim, eu acho que eu tinha: de alguma maneira eu via esse carro de boi, ali, percorrendo as avenidas de Salvador. Você tem toda razão de lembrar do Carnaval. Um carro de boi neon. Tinha muito a ver com as aparições dos trios nas praças, nos lugares; das luzes estroboscópicas. Essas figuras, esses entes mitológicos. Todos eles lembrando um pouco os Filhos de Gandhy, os Cavaleiros de Bagdá, aqueles blocos todos que desfilavam com essas alegorias, e as escolas de samba também, esse lado do Carnaval já de New Orleans, o Carnaval já de Veneza, já de Nice, já de Antuérpia, de todas essas sedes carnavalescas, mesmo na Alemanha; os carros alegóricos com essas figuras: Tron, Xangô, Buda, Touro Sentado, entes mitológicos de várias culturas, várias procedências, várias origens.
É forte, imageticamente. — É bem interessante que tudo isso tenha dado liga poético-musical.
É um sonho, um delírio, como diria um sambista. — É uma epifania! Mas começa com uma imagem simples do carro de boi, gemendo na estrada. Ele vai se ampliando, ganhando dimensões e dimensões que vão se associando. Dimensões no tempo e dimensões no espaço que vão se associando até formar aquele carro de boi neon.
*Extraído do livro Todas as Letras – Gilberto Gil